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  • Giovana Frioli

‘Dar à luz sem dor’: ativista transforma violência obstétrica em processo de cura à outras mães

Atualizado: 7 de dez. de 2021

Fruto de um parto insensível e desumano, Dayane Vecchi, de 26 anos, transformou a dor de seu nascimento em ativismo

Foto: Arquivo Pessoal


Dayane nasceu a partir de violências físicas e verbais. Violações que rasgaram seu próprio corpo e de sua mãe. Logo que nasceu estava roxa e com a clavícula quebrada; as bolhas e hematomas se espalhavam por todo o bebê que havia acabado de nascer. Rosemar, mãe de Dayane, não viu a filha a partir deste momento, não teve notícias, não sabia qual o estado da neném – sozinha, desde o início do parto, o sofrimento foi estendido por mais seis horas.


De uma família muito simples e humilde do interior do Brasil, Rose, se casou com 15 anos e logo decidiu que queria engravidar. Era de sua vontade e por isso elaborou a gestação. Mudou-se para Curitiba com o marido, que havia conseguido um emprego e teve a filha Dayane em uma maternidade da cidade. Jovem, tinha pouquíssimas informações sobre parto e pós-parto não sabia nem como era de fato o nascimento de um bebê. Na época, mal ouvia falar sobre menstruação, sobre parir ou qualquer explicação sobre a sexualidade da mulher: tudo era tabu e uma descoberta solitária.


Em Curitiba, sozinha na sala de parto, sofreu diversas violências obstétricas: manobras, cortes, empurrões e xingamentos. A episiotomia um corte entre a vagina e o ânus foi um dos procedimentos de violação sem necessidade que resultou em dezessete pontos em Rosemar. Mas isso não bastou. O médico e as enfermeiras empurraram sua barriga e forçaram o útero para a saída do bebê, em uma técnica chamada ‘Manobra de Kristeller’, abolida em 2009 pela Organização Mundial da Saúde. Dayane acredita que a manobra foi o motivo para que sua clavícula fosse quebrada.


Além do uso desnecessário de várias técnicas invasivas como o uso do ‘fórceps’, Rose, teve que ouvir ofensas como: “Ah, na hora de fazer foi bom né?! Agora fica aí gritando de dor… vamos ficar quietinha?!”.


O pós-parto foi um período difícil de lidar depois das violências. Suportar os pontos, a cicatrização e uma criança engessada foi muito complicado, mas Rosemar achou que tudo aquilo fosse normal: “Ela pensou que aquilo era o parto; que os médicos e as enfermeiras estavam certos e que as manifestações eram necessárias”, conta Dayane. A falta de informação, foi um dos motivos para que a mãe não percebesse e nem denunciasse a violência.


Conforme crescia, Dayane percebia uma vontade de entender mais sobre os partos. Ainda criança dizia: “Quando crescer quero tirar neném!”. Sua bisavó era parteira e por isso sempre contava histórias das mulheres que pariram e de outras que haviam morrido durante o parto. Esses contos aumentaram cada vez mais a vontade da menina de saber sobre o próprio nascimento.


Dayane, na adolescência, passou a entender que algo dentro dela pedia transformação. Um certo dia, entrou em um estado meditativo e relembrou aquela série de violências e desconfortos que havia passado com a mãe na sala do porto. A partir daí percebeu: “Esse é meu caminho de cura. Preciso curar a mim mesma e às outras mulheres”.


Sua missão seguiu em ajudar outras mães no parto. Fez um curso de doula e percebeu a agressividade do sistema obstétrico brasileiro. Ativista do parto humanizado, Dayane concretizou seu caminho quando deu à luz a Caiuá. Em um ambiente calmo, seguro, acolhedor e silencioso, teve sem filho sem nenhuma intervenção. Com segurança, Caiuá, nasceu dentro da água em sua própria casa: “Ficamos ali por um bom tempo nos conhecendo e nos amando. Um momento de cura que jamais vou esquecer.”. Neste dia, Dayane afirma que quebrou um padrão de violência nos partos brasileiros.


Texto escrito conforme o novo acordo ortográfico.

Variante linguística brasileira utilizada.


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